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quarta-feira, 13 de julho de 2011

A Educação Física Escolar como matéria de ensino

     

A Educação Física Escolar como matéria de ensino - têm suas raízes na Europa de fins do século XVIII e início do século XIX. Com a criação dos chamados Sistemas Nacionais de Ensino, a Ginástica, nome primeiro dado à Educação Física e com caráter bastante abrangente, teve lugar como conteúdo escolar obrigatório.

QUADRO DO MOVIMENTO DO PENSAMENTO DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR
A EDUCAÇÃO FÍSICA E SEU CONTEÚDO DE ENSINO NO TEMPO

MOVIMENTO DO PENSAMENTO NA EDUCAÇÃO FÍSICA
CRONOLOGIA
CONTEÚDO A SER ENSINADO NA ESCOLA
MOVIMENTO GINÁSTICO EUROPEU
SÉCULO XIX E INÍCIO DO SÉCULO XX
- GINÁSTICA QUE COMPREENDIA
EXERCÍCIOS MILITARES; JOGOS;
DANÇA; ESGRIMA; EQUITAÇÃO;
CANTO.
MOVIMENTO ESPORTIVO
AFIRMA-SE A PARTIR DE 1940
- ESPORTE - HÁ AQUI UMA HEGEMONIZAÇÃO DO ESPORTE NO CONTEÚDO DE ENSINO.
PSICOMOTRICIDADE
AFIRMA-SE A PARTIR DOS ANOS 70 ATÉ OS DIAS DE HOJE
- CONDUTAS MOTORAS
CULTURA CORPORAL
CULTURA FÍSICA
CULTURA DE MOVIMENTO
TEM INÍCIO NO DECORRER DA DÉCADA DE 80 ATÉ NOSSOS DIAS
- GINÁSTICA, ESPORTE, JOGO,
DANÇA, LUTAS, CAPOEIRA...

A Ginástica compreendia marchas, corridas, lançamentos, esgrima, natação, equitação, jogos e danças. Surgiu na sociedade ocidental moderna como um movimento de caráter popular e sem qualquer relação com a instituição escolar. Este movimento, bastante vigoroso em todo o século XIX, teve sua denominação definida a partir do país de origem e ficou também conhecido como "escolas" ou "métodos de ginástica". Os mais conhecidos no Brasil foram o Método francês, alemão e sueco, sendo o mais divulgado e que serviu de modelo para um método nacional de ginástica em nosso país, o Método francês. Estes métodos e/ou escolas de ginástica não pensaram a Ginástica na escola, mas os pedagogos e os médicos buscaram neles os princípios básicos para elaborar os conteúdos de ensino da escola, uma especificidade da Ginástica para a escola. Esta Ginástica compreendia exercícios individuais, em duplas, quartetos; o ato de levantar e transportar pessoas e objetos; esgrima; danças; jogos e posteriormente, já no final do século XIX, os jogos esportivos; a música; o canto e os exercícios militares. Durante todo o século XIX vamos encontrar esta abrangência e diversidade de conteúdos de ensino e, sobretudo, uma clara especificidade.

As ciências que dão suporte aos estudos e pesquisas deste conteúdo são aquelas de natureza física e biológica. E isto se deve ao fato de, naquele momento, não haver ainda uma ciência de natureza social. Aqueles que pensaram a atividade física a partir de parâmetros científicos, naquele momento, o fizeram com os instrumentos de seu tempo. É preciso acentuar por exemplo que a Sociologia só irá se constituir como ciência na segunda metade do século XIX e seu estatuto foi dado elaborado a partir da Física; a Antropologia foi, em suas origens, basicamente determinada pela história natural; a Psicologia de fortes características experimentais é também filha deste período; a História era metodologicamente dominada pelo relato cronológico protagonizado pela nobreza, igreja e Estado. Ficavam as atividades físicas, quando tratadas pela ótica científica, e isto era um fator fundamental à sua afirmação e desenvolvimento, diretamente ligadas ao universo científico já constituído, ou seja, aquele das ciências naturais. A partir da última década do século XIX, o termo ginástica ainda é largamente utilizado para denominar a aula que trata das atividades físicas, mas já vem surgindo um outro termo, com o qual convivemos até hoje: Educação Física. Este termo vem acompanhado de um requinte no âmbito da pesquisa científica. Tem lugar a educação do gesto, pensada a partir de análises laboratoriais. Tem lugar também um conteúdo predominantemente de natureza esportiva. A abrangência anterior perde terreno para a aula como o lugar do treino esportivo e do jogo esportivo como conteúdo senão único, certamente predominante. O modelo de aula é buscado nos parâmetros fornecidos pelos métodos de treinamento. As partes constitutivas de uma aula são ditadas mais pela Fisiologia, agora já acrescida do item "esforço", do que pela Pedagogia. Uma parte inicial da aula será destinada a um trabalho de natureza aeróbica, com um tempo para corridas e saltitamentos; numa segunda parte da aula vamos encontrar exercícios de força, flexibilidade e agilidade; numa terceira parte alojam-se os fundamentos de um determinado jogo esportivo com sua posterior aplicação propriamente dita e, para finalizar, há uma volta a calma. A obra de Auguste Listello é singular para afirmar esta hegemonia esportiva no ensino de Educação Física na escola, bem como o modelo de aula baseado nos parâmetros do treinamento esportivo. Todavia, cabe ressaltar que, mesmo com a predominância de um conteúdo de natureza esportiva, a já chamada Educação Física mantém sua especificidade no interior da instituição escolar. O seu conteúdo é de domínio daquele que ensina. Esta situação da chamada Educação Física, pelo menos no Brasil, persiste até a década de 70 quando então, passamos a vivenciar uma situação inédita. A Educação Física perde sua especificidade. Talvez este seja um dos momentos mais ricos e mais contraditórios de sua história recente. Com a afirmação, num primeiro momento da Psicomotricidade nós vamos ter um lado, um vigoroso envolvimento da Educação Física com as tarefas da escola, com o desenvolvimento da criança, com o ato de aprender (talvez bem mais do que com o de ensinar), com os processos cognitivos, afetivos e psicomotores. Mergulhamos num outro universo teórico, metodológico e lingüístico. Descobrimos, naquele momento, que estávamos na escola para algo maior, para a formação integral da criança. A Educação Física era apenas um meio. Um meio para aprender Matemática, Língua Portuguesa, História, Geografia, Ciências... era um meio para a socialização. Meio, esta metáfora biológica e evolucionista foi largamente utilizada pela Educação de um modo geral e pela Educação Física de modo específico. Naquele momento, a Educação Física não tem mais um conteúdo seu, ela é um conjunto de meios para... ela passa a ter um caráter genérico: será de reabilitação? de readaptação? de integração? Talvez ela tenha se tornado um pouco de tudo isto sem exatamente ser tudo isto. Afinal onde ficou a especificidade? Não dá para esquecer que este foi o momento no qual todas as pessoas envolvidas ou não com ensino, davam palpites sobre o que deveria ou não ser do domínio da Educação Física na escola. E o professor começava a sentir-se constrangido se ele não falasse o discurso da psicomotricidade ou melhor, se ele dissesse que ensinava ginástica, esportes, etc. O discurso e prática da Psicomotricidade pretendeu então substituir o conteúdo até então predominante, de natureza esportiva. Talvez possamos sugerir que é a primeira vez em sua história na instituição escolar que a Ginástica, depois chamada de Educação Física é substituída ou pretende-se que seja, por um conhecimento do professor, um conhecimento básico e fundamental de sua formação, mas não necessariamente um conhecimento a ser pedagogizado, ensinado. Conforme podemos observar no quadro apresentado é possível afirmar que as atividades criadas pelo homem no plano da técnica, da ciência e, portanto, da cultura, prevaleceram como conteúdos de ensino da Educação Física até o surgimento da Psicomotricidade no seu domínio, muito embora desde o século XIX já houvessem estudos bastante precisos sobre o gesto e sobre o ato de aprender este gesto. Desde o século XIX, o movimento genérico dos animais e do homem foi objeto de atenção e de um grande número de pesquisas experimentais. A análise do movimento é um tipo de estudo que encontramos de modo mais compreensível já em Amoros e Ling na primeira metade do século XIX e de modo mais preciso, dados os avanços científicos, em Demeny já no final do século XIX e, sobretudo na primeira década deste século. Mas o que aparece como conteúdo de ensino, repito, é a Ginástica, o Jogo Esportivo, a Dança, a Esgrima, Canto, Música. Desde suas origens na sociedade ocidental moderna, vamos sempre encontrar a inegável importância de um conhecimento do corpo sob o ponto de vista da anatomia, fisiologia e mecânica do movimento. Mas também, desde as suas origens vamos encontrar preocupações de natureza pedagógica, busca de relação entre o físico e o mental, socialização, etc. Mas o conteúdo de ensino está lá, mantém seu caráter de especificidade, altera-se em abrangência, profundidade, mas não se confunde.

O discurso e prática da Educação Física sob a influência da Psicomotricidade, coloca de modo nunca antes visto a necessidade do professor de Educação Física sentir-se um professor com responsabilidades escolares, pedagógicas. Busca desatrelar sua atuação escolar dos cânones da instituição desportiva, valorizando o processo de aprendizagem e não mais a execução de um gesto técnico isolado. Muito bem, se de um lado isto foi extremamente benéfico, de um outro foi o início de um abandono do que era específico da Educação Física, como se o que ela ensinasse de específico fosse, em si, maléfico ao desenvolvimento dos alunos e a sua inserção na sociedade. A crítica de natureza mais política que se instaura na década de 80 vai exacerbar, agora com outras tintas, a negação do conteúdo da Educação Física atribuindo ao Esporte e a Ginástica, sobretudo, o caráter de elementos de alienação. As análises de conjuntura substituíram as discussões propriamente acadêmicas que, embora constitutivas de uma dada conjuntura, guardam sua diferença. Uma vez mais se afirmou um discurso que negou a especificidade da Educação Física. Talvez nós sejamos um tipo de professor que em grau maior do que aqueles de outras matérias, costuma valer-se de conceitos de sua própria área em tom pejorativo, denegrindo o que deveria ser de seu domínio. Fazemos tábula rasa do que foi produzido ao longo de quase 200 anos. Não conseguimos acompanhar o movimento do pensamento e perceber como o conhecimento se amplia, se refaz pelos avanços da técnica, da ciência e pela inserção de diferentes práticas em diferentes culturas. Os clichês influenciam mais do que as inúmeras e inúmeras obras sobre Ginástica, sobre Jogo, Dança, e, sobretudo Esportes. É agradável constatar que os anos 90 trouxeram um olhar mais abrangente aos estudos e pesquisas sobre a Educação Física Escolar. Os reducionismos de natureza biológica, psicológica e social parecem não ter mais lugar no debate da área.

Hoje já é possível, no âmbito da Educação Física, pensar a ciência fora dos limites do positivismo e perceber que para tratar das atividades físicas em suas determinações culturais específicas, o conhecimento do homem implica em saber que a sua subjetividade e razão cognoscitiva se instalam em seu corpo e as linguagens corporais constituem-se em respostas a esta compreensão.
Sem esquecer a provisoriedade do conhecimento, afirmo aqui esta retomada da Educação Física como o lugar de aprender Ginástica, Jogos, Jogos Esportivos, Dança, Lutas, Capoeira.
Talvez as pesquisas sobre ensino hoje já possam romper com a visão tecnicista e mergulhar no conteúdo de cada área. Talvez hoje, estejamos necessitando estudar Ginástica, Jogos, Dança, Esportes e de posse destas fantásticas atividades codificadas pelo homem em sua história valer-se, criativamente, de metodologias que encerrem valores mais solidários, que apontem para uma saudável relação entre indivíduo e sociedade e vice-versa. O Ensino da Ginástica ou de qualquer Jogo Esportivo, por exemplo, sempre encerrará em seu interior uma dimensão técnica. Mas uma dimensão técnica não significa nem tecnicismo nem "performance". O lugar da "performance" não é na escola. O caráter lúdico pode prevalecer sempre numa aula de Educação Física, desde que ela seja realmente uma aula, ou seja, "um espaço intencionalmente organizado para possibilitar a direção da apreensão, pelo aluno, do conhecimento específico da Educação Física e dos diversos aspectos das suas práticas na realidade social" (Soares,1996).


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